DESCOBERTA DAS ÁGUAS
Em 1786, João Almeida Fonseca, comandante do Distrito de Sapucaí, escreve carta ao governador da Capitania de Minas Gerais, informando sobre as propriedades medicinais das "águas virtuosas". Ele fala sobre "um olho d'água, Caldas legítima", referindo-se à uma fonte termal em Rio Verde.
Em 1819, o naturalista francês August Saint-Hilaire, que desbravou várias locais do Brasil, passou por essas bandas, descrevendo as características da região, naquela época, campos inabitados. Mas uma coisa, chamou a sua atenção: as águas quentes.
Mas demorou até que as autoridades se dessem conta do preciosismo desta terra. Mais atentos e desesperados, eram os doentes que para cá começaram a se deslocar, em meados do século XIX. A viagem era longa e cansativa, sua hospedagem, em barracas, e o tratamento, da forma mais arcaica possível, em tinas ou gamelas de madeira, ao ar livre.
Porém, muitos se curaram, e a fama dessas águas então se espalhou como rastilho de pólvora, e o lugar há pouco tempo ermo, começou a receber muitas pessoas em busca da cura.
FUNDAÇÃO DA CIDADE
A terra onde o povoado se desenvolvia, em torno das águas, pertencia ao sesmeiro Joaquim Bernardes da Costa Junqueira, que havia garantido seu pedaço de terra em 1819. Mas a grande movimentação de pessoas (principalmente de doentes), em sua propriedade, preocupava o fazendeiro. Ele tentou controlar a entrada em suas terras, mas em certo ponto não foi possível mais.
No início da década de 1870, as autoridades procuravam a documentação referente à doação da sesmaria e não encontrando, procederiam com a desapropriação da área. O Major Joaquim Bernardes, um tanto já preocupado com as questões sanitárias na propriedade, resolveu doar, em 1872, parte da fazenda para a fundação da cidade de Poços de Caldas, o que resolveu os problemas de ambas as partes. Agora, caberia à administração pública cuidar da questão sanitária, de infraestrutura e das várias outras questões urbanas, que surgissem.
DESENVOLVIMENTO DA CIDADE
Assim, Poços começou a ter um pouco mais de estrutura, e em 1886 foi inaugurado o primeiro balneário, o Pedro Botelho, ainda muito rústico, mas bem melhor do que a estrutura (ou falta de estrutura) anterior. Ele era ligado por um passadiço ao Hotel da Empresa, inaugurado dois anos antes. E pousadas e hotéis foram surgindo, mais casas, mais comércio.
Em outubro do mesmo ano, D. Pedro II e D. Teresa Cristina vieram para a inauguração do ramal da Estrada de Ferro da Mogiana. Tomaram banho no Balneário Pedro Botelho, rezaram na Capela de Bom Jesus da Cana Verde, visitaram comércios e participaram de jantares com as autoridades locais. Mas um dos casos mais interessantes contados, foi o do atolamento de sua carruagem na lama da rua, e que Antônio Teixeira Diniz, proprietário de uma pousada, arregaçando as mangas, ajudou a desencravar o veículo. Depois disso e de outras atitudes de Diniz, D. Pedro II concedeu a ele o título de Barão do Campo Místico, hoje, nome de uma das ruas centrais de Poços. Em 1896, foi inaugurado o Balneário dos Macacos. Este prédio foi demolido, em 1975, pela Hidrominas, que construiu o atual, chamado de Balneário Dr. Mário Mourão, em homenagem ao grande médico termalista, que muito contribuiu para a cidade.
Já no início do século XX, figuras visionárias como o Dr. David Benedito Ottoni, médico, que foi prefeito por apenas 17 dias, tinham em mente um futuro promissor para Poços de Caldas. Em 1905, ele desenhou o Plano de Avenidas e Parques para a cidade, com clara influência francesa. Uma ousadia para aquele tempo.
Ousado também foi o Dr. Pedro Sanches de Lemos. Médico termalista, foi à Europa em busca de conhecimento sobre as águas termais. Mas não era só esse tema que o interessava. Ele procurava entender a estrutura e o cotidiano das estâncias balneárias. Seus apontamentos viraram livro: “Notas de Viagem – Na Alemanha, na Suissa, na França.” Na volta, trabalhou para que Poços de Caldas se desenvolvesse no nível das cidades que visitou.
Enquanto isso, ilustres figuras frequentavam a cidade, com Olavo Bilac, Ruy Barbosa, Campos Salles, Rodrigues Alves e Coelho Netto. Este último, escreveu o romance Água de Juventa, em 1904 e publicado em 1925, no qual há um personagem chamado Doutor Lino, inspirado em Pedro Sanches.
Poços já possuía cassinos, pois era necessário haver alguma distração para os “curistas”, como eram chamadas as pessoas que vinham em busca da cura. Geralmente, o tratamento durava 21 dias, logo, era importante e necessário que a cidade oferecesse lazer e entretenimento para a longa estada.
Em 1919, foi inaugurada a primitiva Thermas, como é chamada, pois foi a antecessora das Thermas Antônio Carlos. Na praça à sua frente, o busto do Dr. Pedro Sanches de Lemos, que havia morrido em 1915, e que era homenageado, de forma justa.
TRANSFORMAÇÃO DA CIDADE
Em 1922, Poços de Caldas já tinha arruamento ortogonal e os rios retificados. Mas mudança mesmo, ocorreu a partir de 1927. Neste ano, o então presidente do Estado de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, concedeu a verba, em forma de decreto, para a construção do que transformaria de vez Poços de Caldas.
Foram construídos, o Palace Casino, as Thermas Antônio Carlos, o Parque José Affonso Junqueira e o Palace Hotel, que foi reformado (já havia um hotel e a primitiva Thermas foi demolida) e ampliado da forma como conhecemos hoje. O arquiteto foi Eduardo Pederneiras, que se utilizou, principalmente, do estilo neoclássico nos projetos. Obras ousadas, suntuosas, luxuosas, cheias de detalhes, que foram sendo inauguradas nos anos seguintes. São conhecidas também como “as grandes obras de 30”. As Thermas passou a ser reconhecida como um estabelecimento termal superior até mesmo aos estabelecimentos europeus, oferecendo uma gama de serviços e banhos, com muita qualidade.
A partir de então, a cidade que recebia, em sua maioria, pessoas doentes e flageladas, em busca de cura, passou a receber artistas, políticos, autoridades nacionais e internacionais, como o presidente Getúlio Vargas, que tinha seu apartamento especial no Palace Hotel (ver a publicação O APARTAMENTO DE GETÚLIO VARGAS NO PALACE HOTEL, EM POÇOS DE CALDAS), além de uma elite, que buscava a manutenção do seu status social.
A cidade fervia com festas, shows e espetáculos, e claro, com os jogos nos cassinos. Poços chegou a ter 11 cassinos. Na década de 1930, com todo esse dinheiro arrecadado, foi possível a construção do Country Club, com o campo de golfe anexo, o aeroporto, a Represa Saturnino de Brito, que resolveu de vez o problema das enchentes na cidade, além de diversas melhorias, como o calçamento das ruas. As festas de Carnaval no Palace Casino também eram famosas, atraindo grande número de veranistas, como eram chamados. Todo essa estrutura, esse glamour, esse conforto e essa diversão, eram dedicados aos visitantes. A maior parte da população não tinha acesso a isso (ver publicação TEMPOS ÁUREOS DE POÇOS DE CALDAS, PARA QUEM?).
DECADÊNCIA DO TERMALISMO
Em 1946, o então presidente Eurico Gaspar Dutra, proibiu os jogos de azar no Brasil, o que causou o fechamento dos cassinos na cidade, deixando milhares sem emprego. Além disso, os grandes empreendimentos imobiliários na região litorânea, principalmente em Santos e no Guarujá conquistaram os veranistas, que passaram a preferir a água do mar, em vez da água termal. O desenvolvimento da indústria farmacêutica, também contribuiu para o declínio das estâncias balneárias. Assim, o prestígio, o glamour e o status que estas cidades possuíam, inclusive Poços, nunca mais foi o mesmo.
POÇOS DE CALDAS ATUALMENTE
Hoje vemos que a maioria dos locais construídos na época, para a elite veranista, é bastante frequentada pelos moradores. Além disso, com o planejamento de ruas e construção de parques e jardins, realizados no início do século XX, a população tem a possibilidade de desfrutar de uma cidade planejada em seu centro e de apreciar suas belas praças, parques e jardins. A Prefeitura realiza ao longo do ano, várias atividades musicais, culturais, de esporte e lazer, que beneficiam a população. Os serviços termais, parecem ainda estar distanciados da maioria dos moradores, mas já há um trabalho para que a população usufrua dos benefícios do termalismo. Por incrível que pareça, quem mais poderia se beneficiar das águas sulfurosas, parece sentir que é algo que não lhe pertence. Resquícios do tempo em que somente uma elite tinha esse privilégio? Pode ser. Mas torço para que isso mude.
Talitha Castro
Sou Administradora e Guia de Turismo, nascida em Poços de Caldas, Minas Gerais e, apaixonada pela exuberância natural, cultural e patrimonial da região.
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